“Nossa mensagem é simples e direta: se algo não se propaga, está morto” (2014, p.23). Essa afirmação é do livro Cultura da Conexão, dos autores Henry Jenkins, Joshua Green e Sam Ford, e resume a discussão fundamental da obra. A ideia é de que o conteúdo on line pode ser remixado, transformado e alterado pelo usuário, graças à disponibilidade tecnológica que tornou a cultura mais participativa. Para sustentar essa discussão, o texto trata de temas como comunidades on line, fandom, audiência digital e na radiodifusão, marketing viral, boatos, direitos autorais, curadoria e engajamento.
Conforme o livro, a cultura da conexão pressupõe a circulação de material compartilhado entre diversos grupos, comunidades e culturas. Para os autores, “a ‘propagabilidade’ se refere a recursos técnicos que tornam mais fáceis a circulação de algum tipo de conteúdo em comparação com outros, às estruturas econômicas que sustentam ou restringem a circulação, aos atributos de um texto de mídia que podem despertar a motivação de uma comunidade para compartilhar material e às redes sociais que ligam as pessoas por meio da troca de bytes significativos” (p. 26-27).
Um tópico importante é a discussão entre aderência e propagabilidade. Os dois termos não são sinônimos. O primeiro se refere ao levantamento estatístico de visualizações de conteúdo. Na cultura digital, há um exagero na ênfase desses números, sendo que o ideal seria focar na maneira de tornar o material propagável.
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Marketing Viral
Os autores rejeitam a expressão marketing viral para tratar da difusão de conteúdo digital. O termo deveria somente ser usado para identificar aquilo que o público repassa como algo obrigatório. Por exemplo, um serviço de email gratuito que ao final de cada mensagem tem uma mensagem autopromocional da própria empresa. Para materiais livres com possibilidade de transformação e alteração, o correto é propagação.
Essa condição de propagabilidade leva o livro Cultura da Conexão a chamar atenção à questão dos direitos autorais. “Quando o material é propagado, ele é refeito: seja literalmente, ao ser submetido aos vários procedimentos de remixagem e sampleamento, seja figurativamente, por meio de sua inserção em conversas em andamento e através de diversas plataformas. Esse contínuo processo de transformação do propósito original e de recirculação está corroendo as divisórias percebidas entre produção e consumo”(p. 53-54). Pode ser que o detentor de direitos autorais não esteja disponível a abrir mão da sua propriedade ou não esteja preparado para lidar com as produções criadas pelos fãs da sua obra.
O público está dispostos, muita vezes, a dedicar horas de trabalho para assistir a obra, modificá-la e colocá-la on line. Um exemplo é o pessoal que é fã de animes e traduz os diálogos para inúmeros idiomas. Essa troca, no entanto, é baseada em um pacto de transparência em que o público deve ter consciência sobre quais os usos a plataforma faz do material que ele cria ou edita.
Cult e Curadoria
No capítulo Reavaliação do Residual, o livro trata sobre conteúdo “cult”, curadoria e material residual. Esse último pode ser conceituado como algo antigo, que perdeu valor econômico, mas ainda tem simpatizantes. A mídia digital pode reacender o interesse do público sobre ele, principalmente dos mais velhos e, se adaptado ou reorientado, para grupos mais jovens também.
Tudo isso leva a pensar que a forma de medição da audiência se alterou nos últimos tempos. Os dados da mídia tradicional não dão clareza de quem tem acesso a um material. Há programas de televisão, que mesmo muito populares, têm uma audiência muito mais ampla em plataformas digitais. O detalhe é que isso não ocorre com a íntegra do programa, mas com vídeos fragmentados.
Em Cultura da Conexão, os autores também apresentam o conceito de “produsers”. Trata-se de uma nova classificação do usuário. Ele é ao mesmo tempo público e editor, usuário e produtor.
“O YouTube é um espaço em que todos podem ver o público realizando trabalhos como membros de público: o trabalho de criar significado, de conectar a mídia com suas realidades e suas identidades pessoais e interpessoais” (p. 233)
Engajamento e ambiente de mídia
De acordo com os autores, a propagabilidade dá forma ao ambiente de mídia de hoje. Um texto de mídia deve ser producente, para que ele seja compartilhado. Ou seja, ele tem que ter algum grau de abertura para novas interpretações e reinterpretações por usuários disponíveis a esta tarefa. O importante é lembrar que as pessoas usam esses materiais midiáticos para experiências culturais compartilhadas.
No último capítulo do livro, o texto fala sobre a condição transnacional da mídia digital. Entre os cases abordados estão, cinema nigeriano, a dança Kuduro, o filme Tropa de Elite e a história do super-herói queniano chamado Makmende. ” Em todos os casos, as práticas culturais participativas estão transformando os fluxos de mídia transnacionais, mesmo que o acesso e a participação entre aqueles públicos permaneçam desiguais” (p. 316).
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Cultura da Conexão
Autores: Henry Jenkins, Joshua Green, Sam Ford
Editora: Aleph
Ano: 2014
p. 403
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