Motins do Sertão: O conflito armado do norte de Minas Gerais contra a Coroa Portuguesa

Motins do Sertão - Maria da Cruz - liderança feminina

Há na história do Brasil, um certo consenso de que ela é desprovida de conflitos. Uma inverdade como indica o próprio registro do Arquivo Público Mineiro. Lá, residem documentos que contam um fato pouco conhecido, mas que marcou, no século XVIII, a Capitania de Minas. Insatisfeitos com a cobrança de um imposto que incidiria sobre o número de escravos, proprietários de fazendas, comerciantes e padres do norte de Minas armaram um movimento para destituir o governador da época. Foram meses de luta, perseguição e disputas entre o Império e os líderes da disputa.

O caso entrou para a história do Estado como Motins do Sertão. O ano era 1736 e, segundo Carla Anastasia, em “Vassalos e Rebeldes”, a economia da região tinha uma base agropastoril. Ao mesmo tempo, cidades à margem do São Francisco funcionavam como entreposto comercial e ponto de contato entre o nordeste e sudeste do Brasil. O único imposto que incidia sobre a comunidade era o dízimo.

De acordo com Diogo de Vasconcelos, no livro “História Média de Minas Gerais”, o descontentamento surgiu quando o governo decidiu impor uma taxa que contrariava os donos de terras, que dependiam da mão-de-obra escrava, e, também, comerciantes que seriam tributados conforme o tamanho de seus empreendimentos.

O primeiro ato dos rebeldes foi a expulsão da região dos responsáveis pela cobrança do imposto. De acordo com Maria da Glória Caxito, no livro “De Vila Risonha a São Romão: História, Tradições e Lendas”, animados com a vitória os sediciosos queriam incitar a revolta em todo o Sertão do São Francisco e marchar até Vila Rica, para derrubar o governador interino Matinho de Mendonça Pino e Proença. No entanto, após atacar a cidade São Romão, principal porto do Velho Chico em território mineiro, o que se seguiu foi uma marcha violenta em que fazendas e vilas eram saqueadas.

O movimento que era para ser uma insurgência do povo perdeu apoio. A Coroa iniciou a caçada contra os líderes do movimento. Para os investigadores, os responsáveis pelo conflito eram Domingos do Prado, André Gonçalves Figueira, Pedro Cardoso e Maria da Cruz. Essa última é retratada por Diogo Vasconcelos como uma heroína.

A dona do Sertão

De acordo com Alexandre Rodrigues de Souza, no trabalho “A ‘Dona’ do Sertão”, o governador de Minas estava desassossegado com a presença dela na região. Para o autor, Martinho de Mendonça defendia tenazmente a participação de Maria da Cruz, no desenrolar dos Motins. Ela foi detida, condenada, mas recebeu o perdão de Dom João V. No entanto, o filho Pedro Cardoso foi enviado para o degredo da África e nunca mais recebeu notícias dele.

Apesar da ampla documentação existente no APM sobre os Motins do Sertão, o assunto ainda é pouco conhecido e discutido em âmbito acadêmico. Faltam ainda formas de registrar o que a população local conta sobre o conflito, como em São Romão em que se diz que o número de mortos em uma das batalhas teria chegado a 150. É preciso que os pesquisadores comecem a enxergar que Minas Gerais é muito mais do que a Inconfidência e lancem um olhar mais atento para todas regiões.

Foto: extraída do site da Prefeitura de Pedras de Maria da Cruz

Saiba mais sobre Os Motins do Sertão:

A Revolta de 1736 no Sertão do São Francisco

Uma Revolta e muitas cabeças

A rebelde do sertão: Maria da Cruz e o motim de 1736

Ouça o nosso podcast sobre Arte, Educação, Literatura e Comunicação